Famílias de escolha: quem cuida ou cuidará de você na velhice?

*Texto de Milton Roberto Furst Crenitte*

“Família ê, família ah, família”!!!

Por que essa música dos Titãs pode ter outro sentido para as pessoas idosas LGBT?

Até já discutimos anteriormente sobre o isolamento social e a solidão que as velhices LGBT podem estar submetidas.

Eles expressam maiores chances do que seus contemporâneos heterossexuais e cisgênero de não serem casados, de não terem filhos e de não terem nenhuma pessoa para chamar em caso de uma emergência.

Nesse contexto, é muito importante o significado das “famílias de escolha”, que podem ganhar mais destaque para um idoso LGBT do que a própria família biológica.

Vão ser essas pessoas as chamadas para os ajudarem se a sua situação de saúde piorar ou se o fim da vida estiver se aproximando.

Uma pesquisa realizada em São Francisco (EUA) com 700 homens gays idosos mostrou que 72% deles chamariam algum amigo próximo se houvesse algum problema de saúde, contra 17 % dos que chamariam algum parente biológico.

Entretanto, mesmo sabendo que essa é a realidade de muitas pessoas, infelizmente alguns podem experimentar dificuldades de ter a sua vontade e a voz da sua “família de escolha” respeitadas.

Essa situação pode ser ainda mais dramática nos casos de evolução da Doença de Alzheimer e no fim da vida.

Nessas duas condições a pessoa pode perder sua autonomia e sua capacidade de tomar decisões. Por isso, é tão importante a discussão sobre a criação de documentos que registrem a vontade do indivíduo ou que garantam alguém como o responsável por tomar resoluções caso seja necessário.

Por um lado, o testamento vital é um desses registros, redigido por uma pessoa no pleno gozo de suas faculdades mentais, com o objetivo de dispor acerca dos cuidados, tratamentos e procedimentos que deseja ou não ser submetida quando estiver com uma doença ameaçadora da vida e impossibilitada de manifestar livremente sua vontade.

Por outro, a procuração para cuidados de saúde é uma declaração que elege um procurador, o qual poderá decidir pelo paciente sobre essas questões mencionadas.

Assim, cabe aos profissionais que assistem essa população a orientação sobre a existência desses documentos.

Dependendo da biografia do indivíduo, de suas relações e de suas expectativas talvez algum registro como esses seja interessante.

Por fim, a família para lésbicas, gays, bissexuais e trans pode não ser só um conceito biológico de “papai, mamãe e titia”, como na música, mas sim uma percepção muito mais ampla, contendo aqueles mais próximos e escolhidos ao longo de suas vidas.

E essas relações merecem ser respeitadas e valorizadas!

Milton Roberto Furst Crenitte
Médico colaborador da Unidade de CardioGeriatria – Incor – HCFMUSP
Professor do curso de Medicina – Universidade Nove de Julho

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